sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Da First à Life: O início da epopeia

Life F190 deitada eternamente em berço esplêndido

Na Autosport do final de fevereiro, edição do dia 28 e que precedia o Grande Prêmio dos Estados Unidos, o primeiro da temporada de 1990, uma menção a Life e a Gary Brabham era feita. O espaço que a equipe tinha na mídia era razoável, uma em virtude do bom time de mecânicos que Vita reuniu, outra pela curiosidade do motor nada usual e a última por ser o time do filho de um ex-tricampeão mundial. Além disso tudo, soma-se que era uma equipe estreante.

Nos preparativos para a corrida, Gary dizia:

"Óbvio que ainda temos muito a fazer e não teremos muito tempo no carro até Phoenix. Mas o motor pode ser fantástico. No momento não estamos indo acima de 11.000 RPM, mas em baixa rotação, a partir das 4.000 RPM, o carro acelera como um trem. Espero que isso seja muito bom em um circuito de rua", disse o australiano à publicação inglesa.

Desembarcando nos Estados Unidos, Gary levou sua namorada, que o acompanhava nos boxes e para todos os lados. Como era novidade, filho de ex-piloto famoso e o único nome Brabham ao pilotar no grid, uma sessão de fotos na quinta-feira era pedida pelos fotógrafos.

Brabham e a namorada movimentaram o paddock de Phoenix

Escolhendo qual o macacão irá usar no treino e qual usará na corrida (sic)

Reunião básica

Hora da sessão de fotos...

Click...

Click...

Click...

Click...

Click...

No dia seguinte, bem cedo, com sessão marcada para às 8h, acontecia a pré-classificação para o GP dos EUA. Isso acontecia pois a Fórmula 1 só queria que 30 carros participassem dos treinos oficiais e 26 largassem para a corrida. Mas com 35 inscritos, não havia outra opção do que se digladiarem na pista.

No treino de pré-classificação, Gary Brabham consegue dar apenas 4 voltas lentas no circuito do Arizona, cravando sua melhor passagem em 2min07s147, 34s855 mais lento que o "pole" da sessão, Roberto Moreno, da EuroBrun, e incríveis 38s483 da pole position oficial de Gerhard Berger, da McLaren.

W12 e seu corpo todo assimétrico

Eram três saídas de escape

Tudo pronto para o treino de pré-classificação da sexta-de manhã

"Mas está tudo mesmo?"

"Calma aí, Gary... problemas aqui atrás"

Chegou o tão esperado momento!

A Life estava oficialmente na Fórmula 1

Marinheiros de primeira viagem, ainda mais nos EUA, deveriam confundir o carro com uma Ferrari

Jogo dos 7 erros: Foto 1

Jogo dos 7 erros: Foto 2

Brabham só não foi mais lento que a Coloni

Ele só deu quatro voltas

A melhor das passagens foi registrada em 2min07s147

F35 W12 tinha sérios problemas de funcionamento

Quando você atrapalha uma Osella sua vida não está na bem

Carro nem perdia os adesivos dos pneus, tamanho pouco desempenho que tinha

Mas pelo menos credencial permanente...

... e adesivo de estacionamento eles tinham. Reparem que alguém foi assistir ao treino de classificação, mas não foi na corrida

O motivo de Gary ter dado somente 4 voltas é explicado por Vita, em entrevista a Autosprint, em 2018:

"Novamente tivemos uma quebra de biela - como havia acontecido no teste particular feito em Monza. Além disso, tivemos sérios problemas com a eletrônica. Daquele jeito, era impossível pré-classificar", comentou o chefe de equipe.

Por incrível que parece, a Life não foi a pior equipe do dia. A Coloni, que estava andando com um famigerado motor Subaru, sequer completou uma volta.

O começo da equipe foi péssimo, mas a esperança continuava duas semanas depois, no Grande Prêmio do Brasil.

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Da First à Life: A vida começa em 1990

No papel, o F190 era lindo. Seria bom se funcionasse

Depois do projeto de Lamberto Leoni afundar em 1989, deixando um rastro de dívidas e má reputação, um novo nome chega ao certame para dar uma reviravolta neste projeto natimorto e voltar a estampar as manchetes de jornais e revistas:

"A vida começa em 1990

A Life Racing Engines revisou suas ambições que comentamos na edição de 11 de agosto e não irá construir um chassi de Fórmula 1 antes da temporada de 1990.

O trabalho no motor W 12 de Franco Rocchi está acelerado e ele deverá fornecer motores para pelo menos duas equipes em 1989: Coloni e Minardi.

Com um tempo bastante apertado para fazer o design e construir um carro de Fórmula 1, a Life decidiu em atrasar sua entrada como construtora para a próxima temporada", era o que dizia a pequena nota da Revista Autosport de 26 de agosto de 1988.

Percebia-se claramente a intenção de Ernesto Vita em entrar na Fórmula 1, mas somente com um motor isso não era possível. Seus engenheiros e designers não estavam com capacidade plena para construir um chassi do zero e a história da equipe de Fórmula 1 da Life Racing Engines se baseava somente no W12.


Franco Rocchi ao lado do W12 da Life

O W12 sem os escapamentos era bem bonito

Franco Rocchi, o braço direito de Vita, tinha extensa experiência na Fórmula 1. Rocchi foi recomendado pelo próprio Enzo Ferrari quando Vita foi ao encontro do Il Comandatore.

Em uma época onde a Ford dominava a categoria com seus DFV V8, Rocchi criou um motor que trouxe a Ferrari novamente ao caminho das vitórias e títulos. Em 1975 ele lançou o B15, um motor de 3 litros e 12 cilindros flat que iria dominar a categoria. Foram, de 1975 a 1980, quatro títulos de construtores (75,76, 77 e 79), um de pilotos com Niki Lauda em 1975 e impressionantes 27 vitórias.

Com mais de 65 anos de idade – e depois de sofrer um ataque cardíaco, Rocchi estava para lá de um fim de carreira. Vita queria que ele projetasse um V12, mas a resposta de Franco foi fatídica:

“Vita, eu só retorno se puder fazer o motor em W que não pude fazer na Ferrari”.

Então, sem escolhas, deixou o projeto de Rocchi prosseguir. Franco criou seu motor de Fórmula 1 moderno. Seu primeiro estudo foi de um W18, onde conseguiu tirar excelentes 80 cavalos de potência em seu projeto em escala com apenas 3 cilindros e 500cc. Todavia, com a regulamentação da FISA banindo motores com mais de 12 cilindros, Franco teve que reprojetar seu motor, mantendo o pouco usual modelo em W, mas agora com 12 cilindros.

Cada bancada possuía um bloco de 4 cilindros em linha que, quando unidos, possuíam a mesma largura de um Cosworth, mas sensivelmente menor, visto que não possui dois cilindros por fileira, como nos clássicos F12 ou V12 - que em outrora fabricou. O motor pesava 140 kgs e, tanto Rocchi quanto Vita não estavam preocupados com a potência da usina naquele momento.

Em Fevereiro de 1989, Vita disse que tinha interesse de compras de chassis de várias equipes para a Life, como a March, Coloni e Onyx - mas que ainda queria fazer mais testes no motor e, eventualmente, até construir seu próprio chassi.

Mas meses se passaram e Vita se viu novamente apertado para estrear sua equipe. Em junho de 1989 ele desistiu de vez e firmou o acordo que tanto queria para colocar seu "time na rua", como disse à Autosport de 29 de junho de 1989.

"First vende-se para a Life

O projeto abortivo de um Fórmula 1 da First, de Lamberto Leoni, foi vendido em formato de protótipo para a Life Racing Engines.

De design assinado por Ricardo Divila, a First testou na pré-temporada com Gabriele Tarquini, mas contudo, o time cancelou os planos de se juntar ao circo da Fórmula 1 no último minuto por causa de sérios problemas financeiros.

A Life está desenvolvendo o seu 3.5L W12 por um ano e pretende correr com ele no ano que vem. 

A compra do chassi da First permite que a equipe coloque a prova seu motor. A sensação italiana da Fórmula 3, Fabrizio Giovanardi, é esperado para correr".

Chassi da First já na fábrica da Life em Formigini, perto de Modena 

Tudo era muito justo no L190

Mas nem só de carro e motor se tem uma equipe de Fórmula 1. Vita precisa de dinheiro e uma vaga na Fórmula 1.

“E fui até Ecclestone, em Londres, com minha secretária ítalo-australiana atuando como intérprete. Cheguei e falei a ele ‘Tenho 37 anos e quero entrar na F1’. Bernie me recebe, mas me ouvindo em silêncio. Quando terminei de expor todo o projeto, ele refletiu no meio minuto mais longo da minha vida e então sorriu, me dando dois tapinhas afetuosos e apertando minha mão, dizendo: ‘Eu gosto de você, Sr. Vita! A Life está registrada para o mundial de 1990. Envie o pedido para a FIA e tudo vai ficar bem, confie em mim. Agora é hora da festa: vamos jantar!’”

“O jantar acaba sendo chique, Bernie é absolutamente requintado e o sonho da Life continua. Na frente de patrocínio, peço a Agip se podem me dar dois bilhões de liras - enquanto dão dez para a Ferrari - mas me fornece 150 milhões de liras em cupons de gasolina, com os quais eu e meus funcionários ficamos livres de reabastecimentos por mais de dois anos. O presidente da Goodyear, por simpatia, garante-me o fornecimento de pneus de graça. Como piloto, um ‘broker’ me aconselha Gary Brabham, que diz trazer patrocinadores de dois bilhões de liras. Portanto, eu digo sim."

"Recebo uma carta de seu pai, a lenda Jack Brabham, que me agradece pela confiança dada ao descendente. Temos também um piloto de testes, Franco Scapini. A mídia italiana enlouqueceu e tinha pedidos de entrevistas de todos os lados”, revelou Vita em uma recente entrevista a Autosprint.

Ernesto Vita esteve na redação da revista Autosprint em 2018

Mas como nada é de primeira na vida da First/Life, o time teve problemas na adaptação do chassi ao novo motor. Além disso, sua potência era 200 cavalos a menos da esperada. Estavam conseguindo colocar apenas 420 cavalos, quando um bom motor teria que trabalhar em 650 cv. Mas a idéia de ter um motor potente como um V12 e compacto como um V8 seguia firme na cabeça de Vita e Rocchi.

Só que o motor quebrava constantemente, inclusive na bancada de testes e a Life só conseguiu colocar o carro na pista no começo de 90. E as honras do debut foi para Gary, que fez o shakedown da equipe no circuito de Vallelunga, ao norte de Roma.

Gary já havia testado pela Benetton... 

... e pela própria Brabham, antes de se juntar à Life

"O time se interessou em mim porque eu tinha algumas experiências com testes de Fórmula 1, como a Benetton - além de ter a Super Licença".

"Eu fui convidado para ir à fábrica e esperava pelo menos assinar um contrato de teste. Ao invés disso, eles me ofereceram um contrato de dois anos! Eu continuo batendo na minha cara para ver se isso é verdade. Estou muito surpreso. Eu estava olhando para a F-3000 no Japão, então, essa é uma oportunidade brilhante.

Eles ainda não me deram números de potência do motor, mas pude vê-lo funcionando no dinamômetro, com toda a eletrônica e tudo que possuem na fábrica e isso explodiu minha mente. Várias pessoas são ex-integrantes da Ferrari e isso tem muito valor para mim. Eu penso que o time tem grande futuro", revelou Brabham à Motoring News em janeiro de 1990.


 Brabham no Shakedown do F190 em Vallelunga

 Nada alem de testes básicos foram feitos

 Scapini, ao lado do carro, pegando impressões com Brabham

Scapini, que não trazia dinheiro, não treinou muito

Brabham vinha de um ano fantástico em 1989, vencendo o campeonato britânico de F-3000, torneio que usava carros de um ano de uso na F-3000 Internacional. O australiano bateu nomes como Roland Ratzenberger, Perry McCarthy, Damon Hill, Pedro Chaves e os brasileiros Marco Greco e Paulo Carcasci, que sempre andaram bem.

Além de Gary, chamaram o experiente piloto italiano Franco Scapini para ajudar nos testes. Depois de uma década correndo por campeonatos locais, tanto de F3 como F3000 - e com passagem nos EUA, na Indy Lights, e nas 24h de Le Mans, Franco vinha como papel de piloto conselheiro de Vita.

O teste de Vallelunga serviu para saber se o motor funcionava no carro, pois como nunca tinha ida para uma pista, precisavam desse check. O carro passou no teste, mas não quer dizer que se cronometrou alguma volta.

 Franco Scapini dando seus pitacos em Vallelunga

Para um primeiro teste, tudo muito bonito. Equipe grande chamava a atenção

O teste aconteceu em fevereiro de 1990, menos de 30  dias antes da temporada começar, nos Estados Unidos. Tudo, como sempre, era feito em cima da hora na Life. Com o primeiro shakedown feito, Vita, Brabham e Scapini foram para Monza para o primeiro teste verdadeiro. O F190 iria se colocar a prova em conjunto com o F35 de Rocchi. Seria esse o casamento ideal para colocar o time "por volta da 15ª colocação", que era quando Vita respondia qual seria a posição que o carro estaria no grid.

Rara foto da Life testando em Monza

Segundo Franco Scapini, que falou com o F1 Nostalgia, não foi bem assim. Em um rápido bate papo, o italiano contou como foi um pouco desses testes de pré-temporada.

"O nosso primeiro teste foi em Vallelunga, depois fomos para Monza. Em Vallelunga não tenho nenhuma lembra em especial, pois foi somente para o shakedown do carro. Mas em Monza, no segundo teste, nós forçamos ao máximo, mas depois de 3 voltas eu quebrei o motor... o primeiro de uma longa história", disse Scapini.

Scapini, Vita e Brabham... tudo pronto para a temporada de 1990

E após esses "valiosos" testes, o time estava “100% pronto” para estrear em Phoenix.

Aguarde as cenas dos próximos capítulos (que prometo que não demorarão mais de dois anos para chegar).

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Da First à Life: Ascensão e queda de Lamberto Leoni

A nova equipe italiana de Fórmula 1. Foto da capa da AutoSprint: "First Lady"

"Acordo da First F1 é anunciado

Conforme reportado meses atrás, a First Racing já está planejando ter dois carros para a próxima temporada. O time de Lamberto Leoni correrá com motores Judd e o carro será projetado por "Richard" Divila.  Marco Apicella e Pierluigi Martini, pilotos da equipe na F-3000, estão ligados ao projeto. Contudo, é virtualmente certo que Martini vá para a Minardi. Seus contatos com a Camel o fizeram ser mencionado na Lotus, também."

Adaptação, Revista AutoSport, 8 de setembro de 1988.

Quem comprou a edição quinzenal da revista naqueles dias - e leu a matéria, tinha certeza que uma nova equipe estava chegando à Fórmula 1 em 1989. Bons nomes envolvidos traziam a oficiosidade e confirmavam essa especulação. O jornal Motoring News da semana anterior também trazia informações, só que sem confirmar muita coisa.

E apesar de não ter uma confirmação oficial, por release ou depoimento, eles estavam absolutamente certos. Lá nos arredores de Milão, Lamberto Leoni estava concretizando seu sonho de ter uma equipe de Fórmula 1. E a ajuda de Ricardo Divila foi imprescindível neste ponto.

O engenheiro brasileiro pegou como base para o carro um chassi de F-3000. Mas não era um qualquer, era um dos melhores e assinado por, nada menos que Adrian Newey, um jovem inglês que já chamava a atenção nos paddocks das corridas.

Modelo base para o projeto foi o March 88B da F-3000

Carro tinha um desenho tradicional. Não fugia do que víamos na Fórmula 1 daquela época

Divila utilizou a tecnologia já convencional para a época que era a união de Fibra de Carbono com Kevlar, mesmo sem uma autoclave na fábrica. A suspensão era do tipo pushrod tanto na dianteira quanto na traseira e o tanque de combustível era central, ficando no entorno do piloto. Na traseira havia um difusor de ar grande na parte de baixo. Nas laterais, um desenho baixo e estreito, como um F-3000, tornava o desenho característico. E na seção dianteira, um bico muito fino e em forma de cone se estendia até o piloto, cobrindo suas mãos e se tornando uma arma perigosa no caso de uma colisão frontal.

Já que citamos esse piloto, nesse meio termo foi confirmado com uma pequena surpresa. Nenhum dos dois atuais da First na F-3000 foi promovido, sendo Gabriele Tarquini, da Coloni em 1988, o escolhido. Ele já havia pilotado para Leoni em 87, na “categoria de acesso”.

Todas essas informações chegaram a público em novembro daquele ano, quando a produção da revista italiana AutoSprint conseguiu, com exclusividade, mostrar a fábrica da equipe em Milão. Designados para a tarefa, o repórter Guido Schittone era escalado junto com o fotógrafo Angelo Orsi para registrar o momento. (Orsi é o mesmo que acompanhou toda a carreira de Ayrton e que estava na Tamburello no fatídico 1º de maio de 94 e fez toda a sequência do atendimento à Ayrton e não divulgou as imagens.)

Kevlar + Fibra de Carbono = Tecnologia de ponta, mas sem equipamentos na fábrica

Volante ficava escondido debaixo da cobertura do cockpit

Desde aquela época, apesar de ter construído o carro quase sem dinheiro, Leoni tinha medo do retorno negativo e financeiro que seria estar na Fórmula 1 e não aparecer em nenhum lugar por causa das instituídas pré-qualificações. Em grids grandes, com número excedentes de pilotos e equipes, a FISA colocava em prática a pré-qualificação, que era, nada mais nada menos, um treino na sexta-feira bem cedinho em que os melhores colocados da ralé iriam ter o direito de participar do GP - mas ainda correndo o risco de não estar entre os 26 que largavam - e que limava o restante de competidores que não ficassem entre os primeiros. Em 1988 poucos carros ficavam de fora - quando ficavam. Mas para 89 esse número tinha a previsão de aumentar, e muito, com as novas equipes que chegavam à Fórmula 1.

"Você imagina eu ir para o Rio de Janeiro, gastar com passagem e hotel até domingo e não nos pré-qualificarmos. Elas são totalmente descontroladas e assassinam nosso orçamento", reclamava Leoni à Autosprint.

Todavia, ele era esperançoso quando perguntado qual era a posição que esperava que o time ficaria na temporada de 1989.

"Eu não sou tolo de pensar que iremos disputar com as grandes equipes no começo. Elas são imbatíveis. Para nós, seria uma vitória se conseguíssemos ficar por volta da 15ª, 20ª posição no grid. No momento não podemos esperar mais, mas já estaremos satisfeitos com isso", disse Leoni.

First desmontada? Temos sim! E no melhor estilo Marco di Bari

Habitáculo apertado do F189

Mecânicos mexendo no carro

Motores Judd foram utilizados pela Williams, March e Ligier em 1988

Detalhe da suspensão Pushrod traseira fixada no câmbio

Detalhe da suspensão Pushrod dianteira

Contudo, a vida cor de rosa - se é que podemos falar que ela foi colorida em algum momento - acabou dias depois. Seu projetista, logo após o projeto pronto, abandonava o barco. Sem receber, Divila saiu da equipe e foi para a Ligier. Tive a oportunidade de conversar com ele no WEC, em Interlagos, salvo engano, em 2012. Ricardo não ficou tão contente em lembrar dessa história, mas contou um pouco. Foi algo assim (perdi minha gravação, infelizmente).

"Leoni era um entusiasta, mas não tinha dinheiro para me pagar, pagar fornecedores... ninguém. Preferi sair do projeto e ir para a Ligier, que me procurou na época. Via que havia problemas a serem consertados, mas que, como não tínhamos dinheiro, eles iriam se manter. Não dava para trabalhar assim", falou Divila.

Câmbio integrado com o motor 3.5 Judd V8
 
Ricardo Divila analisando seu projeto

Lamberto Leoni e Ricardo Divila. Separação foi por problemas monetários

Divila, inclusive, pediu que seu nome não fosse ligado ao projeto. Relatos falam de sérios problemas estruturais, principalmente no que tange as estruturas que se ligavam à caixa de câmbio, coluna de direção e chassi, que não foi feito da forma devida em virtude do escasso monetário.

Com um carro, um piloto, 20 pessoas no staff e sem dinheiro, bem ou mal Leoni tinha uma equipe. Mas para ver se estava tudo ok, ele precisava treinar. Onde? Monza foi a pista escolhida para a First Racing F1 estrear seu F189.

Gianni Marelli, em pé, observa o trabalho dos mecânicos enquanto Leoni ouve Tarquini

Nos primeiros dias de dezembro, Leoni despachou seu carro para Monza e contratou os serviços do Studio di Milano para evoluir e finalizar o projeto de engenharia. Gianni Marelli assumia o cargo de engenheiro chefe e Ralph Bellamy assumia o controle da parte de suspensões.

Tarquini fez um shakedown em Monza, mas nunca exprimiu grandes velocidades nos testes. Pelo menos saíram de lá com a certeza do que tudo funcionava. Leia-se tudo: volante vira, acelerador acelera, freio freia...

"Acelerando" em Monza com Tarquini no comando

Aproveitando um fim de ano para ganhar quilometragem, Leoni inscreveu a First para o Trofeo Indoor do Bolonha Motor Show - que já escrevemos anos atrás aqui no F1 Nostalgia. Era uma prova em circuito fechado onde os mais rápidos continuavam e os mais lentos ficavam pelo caminho.

Pelo traçado curto, mas que dava para chegar a 140 km/h, Tarquini ficou já na primeira rodada quando saiu da pista e tocou nos pneus, danificando a suspensão traseira. Gabriele foi eliminado, justamente, pelo piloto da First na F-3000 Pierluigi Martini e sua Minardi... Luiz-Perez Sala, companheiro minardeiro de Martini, levou o título para casa depois de bater Alex Caffi e sua BMS Dallara na final. First era a única equipe a andar com os Goodyear quando todos os outros andaram com os macios da Pirelli.

No evento, os patrocinadores que deram cor e um “tchan” para a First eram exatamente os mesmo da F-3000: Sare, Reporter e Biting. O número utilizado lá, o 9, não seria o mesmo na temporada de 1989, uma vez que em 88 a Zakspeed correu com ele e em 89 quem iria correr seria a Arrows.

Trofeo Indoor, no Bolonha Motor Show de 1988

Bom público acompanhava esse tipo de evento

Número 9? Só aqui no Indoor Trophy... em 1989 a numeração seria o 42 para Tarquini

Sare, Reporter, Bitting, Honeywell Bull... alguns dos nomes estampados no carro...

Tarquini saiu na primeira rodada ao quebrar a suspensão de seu First F189

Na virada do ano, apesar de vários problemas, a imprensa não cansava de buscar o companheiro de equipe de Tarquini – já que Leoni posteriormente confirmou dois carros. A imprensa, principalmente a britânica, estava colocando vários pilotos no segundo F189 da equipe para correr com Tarquini. Um dos que chegou mais perto foi Julian Bailey, que de fato entrou em conversação.

Em visita à sede da equipe, teve uma impressão boa de cara:

"O comprometimento é incrível. A equipe está construindo um segundo carro e trabalhando em uma nova fábrica, também", afirmou o inglês, que parecia sedento por uma vaga na Fórmula 1 por elogiar tanto ao jornal Motoring News.

Mas pasmem, sim, houve a contratação de um segundo piloto para a First F1. Mesmo sem carro, Colin Bennett, piloto experiente, mas de qualidade contestável, assinou um contrato com o time.

Só que em março de 89, dias antes do começo da temporada, Bennett quebrou o silêncio que pairava Milão. A First, Leoni, Tarquini e cia ltda simplesmente não se pronunciavam para nada...

"Nós estávamos prontos e já reservamos as coisas no Rio de Janeiro (palco da primeira etapa). Mas estou muito insatisfeito com a falta de comunicação daqui com a Itália. Eu dei meu ultimato e eles não responderam. Simplesmente lavei minhas mãos e voltei a me concentrar na F-3000", revelou.

E porque Leoni sumiu? Simplesmente pelo motivo que seu sonho bateu na porta da Fórmula 1, mas não entrou. Com problemas, sem dinheiro e sem poder fazer o crash test da Fórmula 1 sem carro reserva, teve que abandonar o projeto e adiar seu sonho... Era o fim doloroso da First Racing na Fórmula 1, que entrou pela garagem e saiu pela porta dos fundos e com as luzes apagadas.

Da First à Life

Parte 1: Os avós
Parte 2: Ascensão e queda de Lamberto Leoni